Do
Espírito das Piriguetes
Causa e efeito, palavra e gesto, discurso
e ação podem ser tomados por categorias mentais indissociáveis na definição dos
homens em sociedade. Não é possível, segundo o que consta nesta prerrogativa,
conceber uma explicação plausível ao comportamento humano lançando mão do
binômio palavra\ação, cuja mediação está assentada nas operações íntimas do
pensamento. O pensamento por sua vez, posto que seja livre, dialoga com
diversos fatores distintos, variando com os sinais que vão sendo apresentados
no cotidiano, quais sejam: novelas, filmes, artistas, personalidades, a relação
sujeito-sujeito, sujeito-objeto, sujeito-natureza, etc. Apesar do caráter íntimo
com qual o pensamento se articula, ocupando a dimensão subjetiva dos
indivíduos, ainda assim não exclui a possibilidade viva do acesso de segundos e
terceiros às suas entranhas, pois, não querendo os homens reservar a si mesmos os
seus sentimentos, desenvolveram duas linguagens – a fala e a imagem – e desde
então suas almas foram traduzidas.
Palavra e imagem associadas são reveladores
das verdades alheias, porquanto permitem aos astutos penetrar no horizonte
mental das pessoas, mapeá-los, e por assim dizer, conhecer seus desejos mais
reservados, seus objetivos, medos, dramas, frustrações, preferências e
tragédias. Foi, por exemplo, uma estratégia desenvolvida pelos jesuítas do
século XVII, quando da cristianização dos indígenas na Amazônia, incutir a
língua portuguesa naqueles homens, porque os padres da Companhia de Jesus
sabiam que por meio desta, conquistariam o acesso ao pensamento dos índios, uma
vez que para pensar é necessário acionar mecanismo cerebral específico, e uma
língua em comum se torna peça fundamental para quem quer saber qual a linha de
raciocínio que cerca uma palavra, uma frase, etc., já que linguagem são signos que
nos servem de recursos concretos para a manifestação de nossas mais profundas
demandas.
E é exatamente baseado nos pressupostos
supracitados de palavra e ação que tentarei operar na análise geral do fenômeno
do periguetismo, porque palavra (discurso) significa, nesta perspectiva,
horizonte mental, e ação (imagem) é o reflexo no corpo e na vida dos códigos e
imagens presentes no rol de referencias dos indivíduos, é a tradução concreta
de um ideal estético, de um modo de ser\estar e sentir, e dos sentidos que
norteiam uma trajetória.
Com freqüência tem se falado sobre esse
personagem social muito em voga nesses tempos de esbórnia quase generalizada no
Brasil: a Piriguete. Algumas pessoas, especialmente mulheres, divergem nas
opiniões sobre o assunto, cujo discurso vai desde quem seja taxativa em dizer
que as piriguetes são vagabundas (uma releitura da prostituição indireta), até
quem concorde com essa postura feminina dizendo que faz parte da mulher
moderna.
Mas como identificar uma típica piriguete?
Bem, algumas características da moda piriguete, de tanto evidentes que são,
saltam aos olhos: roupas extremamente curtas (justas) e apertadas, o penteado
ordenadamente esticado via chapinha, muita maquiagem no rosto resvalando ao visual
noiva cadáver e gravíssimos problemas na construção do raciocínio coerente.
É essencial ao fenômeno do piriguetismo a
beleza física, para essas mulheres a medida da vida está vinculada diretamente
à forma exterior das coisas, a validade de um relacionamento afetivo baseia-se
no padrão corporal imposto pela mídia e acatado como verdade absoluta por elas.
A futilidade povoa a consciência dessas pessoas, quando numa entrevista
pergunta-se a uma piriguete por que ela se veste daquele jeito, a resposta é
sempre a mesma: “porque o que é bonito é para se mostrar”. Analisando esse
discurso proferido por elas e comparando com o da mulher que pensa, percebemos
que o campo visual de uma piriguete é o mesmo do de uma mulher de verdade,
todavia o que difere esses dois tipos femininos é a profundidade com que ambas
enxergam, pois as primeiras, apaixonadas pelo superficial, por mais que se
esforcem, conseguem alcançar apenas as aparências que, por vezes, não passam de
um rascunho muito deformado da realidade; já as segundas, revestidas de
recursos e com o olhar treinado, penetram na essência do ser humano e
vislumbram outras possibilidades.
A piriguete se emociona com o funk, porque
esse estilo musical tem um significado central na afirmação de sua
personalidade, suas letras dizem para o mundo quem ela é. Ademais, o funk é
parâmetro hierarquizante do piriguetismo, e aquela que desce até o chão,
embalada pelo som de Mc-Catra (o profeta das piriguetes) tem status elevado no
meio das outras, estaria num patamar superior em relação às aspirantes. Elas
não sabem conversar outro assunto que não seja roupa e festa, e quando
perguntadas sobre a vida, o mundo e as artes, respondem laconicamente: “é
verdade”, “com certeza”, “anram...”. Dada sua limitação mental. Não há nada
mais entediante a uma piriguete do que um professor em sala de aula, porque
este representa um empecilho ao sono da beleza, à academia ou ao encontro com o
cara do som automotivo.
Voltando ao âmbito da indumentária, o ato
de vestir-se diz muito sobre quem é uma pessoa, pois a ação de escolher
voluntariamente uma roupa expõe nossas intenções de aparecer no mundo. Alguns,
quando se vestem, preferem passar a imagem de tranqüilidade, portanto vestem
branco; outros querem demonstrar credibilidade, usam o azul (por isso que o
Jornal Nacional tem como pano de fundo o azul); querendo ser identificado como
revolucionário, a cor é o vermelho, etc... As piriguetes desenvolveram uma
técnica que, por meio da indumentária, chama-se a atenção dos homens, mas
infelizmente sua estratégia tomou rumo nebuloso quando confundiu sensualidade
com vulgaridade; elas saem com roupas chamativas que lhes atribui visibilidade,
porém com prazo de validade para acabar, porque homem até sente atração sexual
por piriguete, mas nada que se compare com a sensualidade, a elegância, a
classe, o estilo e o poder de uma Mulher de Verdade, porque estas sim são
eternas.
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